Começa daqui a meia hora


E a única coisa que eu espero, é aprender esta lição:
"Qué difícil es guardar la distancia adecuada"

O mar comeu-o

Ele era um erasmus de despedida que daqui a duas semanas voltava para casa. Era um erasmus como todos nós: com uma cerveja na mão e uma pergunta na boca: "Quando é a próxima festa?"
Não sei se estudava, se era inteligente ou até boa pessoa. Não sei. Mas na quinta feira, depois de uma festa, o mar da Coruña comeu-o. Três policias viram-no, atiraram-se para a água para salva-lo e nunca mais voltaram. Nenhum dos 4.
Um drama na cidade e em toda a Espanha. Um drama que ultrapassou as fronteiras. Ouço os helicópteros a passar por cima da minha casa, o paredão está interditado e o mar, bravo, é visto com medo e receio.
Eu tenho pena. Pelo rapaz. Pelos pais do rapaz, já em terras espanholas. E que além de ter perdido o filho, vão ter de pagar todo o operativo de busca dos cadáveres (que custará uns 100.000 euros). Tenho pena dos policias (agora heróis) e das suas famílias que as vejo chorar todos os dias quase à porta de minha casa.
Mas tenho principalmente muita pena dos danos colaterais. Na rua o comentário é "Ai, esta juventude está perdida", esses "jovens irresponsáveis", "o erasmus é um antro de bebedeira".
Uma vida a lutar contra esse preconceito.
E agora, isto.

Roma, Sevilha ou Mar?

Chi va a Roma, perde la poltrona.
Quien va a Sevilla, pierde la silla.
Quem vai ao mar, perdeu o lugar.

Acaba o dia

Acaba o dia e cheiro a cara lavada de maquilhagem. Tenho uma mola a segurar o meu cabelo alisado e uma roupa que nao é a mesma que vestia à uma hora atrás.
Tenho a marca dos óculos no nariz e ainda é preciso conduzir meia hora até chegar a casa. Ainda bem que neste horario (indecente) já nao há ninguém na estrada.
Abro a porta e as luzes estao apagadas. Ciudado para nao fazer barulho. Aqueço o leite e tiro-o meio segundo antes do microondas para nao apitar.
Ainda falta tomar banho, por o pijama e tentar ler um pouco (a minha média actualmente é de uma página por noite). É uma da manha e o despertador vai tocar outra vez às 8h.

L'estaca

Ultimamente em Espanha temos falado muito sobre a ditadura. Eles contam-me coisas do Franquismo e eu sobre o Salazarismo. Falamos de liberdade, de tortura e de revolução.
Porque aqui o grande problema é que mais de 30 anos depois, o Franquismo ainda não está superado. Ainda há muita gente que não condena a ditadura. Ainda há muitas ruas e estatuas que tem nomes de generais falangistas. Ainda há símbolos espalhados pelas casas e até a semana passada ainda havia ministros de Franco que pertenciam ao senado.
Agora esse ministro morreu e fizemos muitos programas e jornais especiais sobre ele e sobre a Transição. Porque aqui não houve cravos nem revolução. Houve uma "Transição" que, 30 anos depois, não está acabada.
E cada vez mais parece que esse tema da liberdade, dos princípios e da moral continuam sendo actuais. E, enquanto falamos disso, cantamos:
"Si jo l'estiro fort per aquí i tu l'estires fort per allà,
segur que tomba, tomba, tomba, i ens podrem alliberar"

Tradução:
"Se eu puxo forte daqui e tu puxas forte dali,
Com certeza cai, cai, cai, e vamos poder ser livres"

Piscina

Cada um tem o seu truque, a sua mania, a solução para os seus problemas. A minha é a piscina.
É ali onde tomo as grandes decisões da minha vida, onde tenho a melhor ideia para os títulos das minhas reportagens, onde dou forma às centenas de minutos de entrevistas. É ali onde eu decido o que vou dizer ao fulanito, a mensagem que vou mandar àquela amiga, o que vou fazer de almoço e que filme vou ver à tarde.
É ali onde eu formo a minha opinião sobre o último escândalo político ou as novas medidas económicas.
Porque ali sou só eu. (Eu e a agua que entra pelos meus ouvidos)
E é tão difícil estar sozinho. Totalmente sozinho. Sem outras opiniões, sem o skype o facebook ou o livro que está na cabeceira. Sem um amigo, uma televisão ou um telefonema do namorado. Sem radio. Sem música. Sem a casa que está suja ou o pão que está na tostadeira. Sem tenho fome, tenho sede, tenho mesmo de ir ao supermercado.
Na piscina sou eu sem mais nada. E até gosto de mim.

Não sei se sou só eu

Mas quando estou muito, muito, muito cansada acho sempre que é melhor não tentar descansar.

"Não tenho tempo"

Quando um jornalista já não tem tempo para escrever, é que alguma coisa está mal. Estamos a trabalhar demasiado, a falar muito ou a sair demais. Achamos que isso é bom, mas não é. Porque jornalista não pensa, escreve. E eu acho que é aí que está o problema. Quando acreditamos que já não precisamos escrever.
De repente, quando nos apercebemos, estamos totalmente afogados pelos textos de um minuto. Pela economia da palavra, por aquela imagem que precisa respirar. O alarme soa quando te zangas com a tua maquilhadora pela roupa feia que te trouxe ou pela sombra escura dos olhos. Não, isso não é jornalismo.
Às vezes parece que vão juntos. O jornalismo e a futilidade. Mas a culpa disso é de não escrever.
Não prometo nada, mas prometo tentar.

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